Z (1969), Costa-Gavras.
Cinema e política sempre estiveram misturados, seja para efeitos de propaganda, seja para defesa de ideias. Mas talvez o auge deste tipo de filme tenha ocorrido nos anos 1960, quando a sociedade vivia um turbilhão de mudanças e a juventude tinha pretensões de mudar o mundo. E a obra cinematográfica que talvez mais tenha marcado essa época é Z, do diretor Costa-Gavras, baseado num romance de Vassilis Vassilikos.
Z não só conta uma ótima história, como tem a pretensão de denunciar o regime de exceção vivido na época pela Grécia, terra natal do diretor. Filho de um militante comunista que combateu a invasão nazista na Segunda Guerra, Costa-Gavras utiliza o cinema como arma de militância política, não para fins eleitoreiros ou partidários, mas como campo para denunciar as grandes injustiças e o debate engajado de ideias, tudo isso sem abrir mão do apuro técnico e da construção de um grande roteiro, com personagens cativantes e certa dose de bom humor.
O filme já inova ao afirmar que semelhanças com fatos reais são intencionais – nada de coincidências. Ele retrata um acontecimento político que resultou num golpe de estado na Grécia dos anos 1960. Um político jovem, crítico à política externa grega aliada aos EUA, é assassinado após um tumultuado comício, e as forçar governistas tentam forjar evidências de que tudo não passou de um acidente. Mas um juiz honesto e um repórter combativo tornam impossível de se acreditar na versão oficial, e só a força bruta é capaz de derrotá-los.
Uma das grandes inovações trazidas por Z foi a edição ágil e a montagem em estilo documental, com um ritmo que até hoje funciona muito bem. Não à toa, ganhou o Oscar de Melhor Edição, além de Melhor Filme Estrangeiro. Aliás, foi o primeiro a concorrer tanto nesta categoria como na de Melhor Filme. Fez sucesso também de bilheteria nos EUA, ainda traumatizado com o assassinato dos dois irmãos Kennedy e em plena luta pelos direitos civis. Além disso, ainda valeu a prêmio de Melhor Ator em Cannes para Jean-Louis Trintignant, que interpreta o magistrado que conduz as investigações (para quem não lembra dele, é o protagonista do filme Amor de Michael Haneke).
Um destaque deve ser dado à trilha sonora de Mikis Theodorakis, não só por sua qualidade, mas porque teve que ser gravada enquanto seu autor estava em prisão domiciliar por ser perseguido pelo regime grego. Acho que poucas vezes a expressão “cinema de guerrilha” foi tão bem empregada.
Ainda hoje é impossível falar de cinema político sem lembrar de Z. Sua influência se estende até os dias de hoje, como em filmes como Tropa de Elite (não à toa, Costa-Gavras é homenageado em um easter egg em Tropa 2). Sua grande importância, para além da técnica cinematográfica, é nos lembrar o quanto a democracia é frágil e difícil de se manter, que o discurso jurídico muitas vezes pode camuflar uma situação política de ruptura institucional, e que quem chega ao poder não tem escrúpulos para nele se manter, utilizando-se da mentira e da força bruta para normalizar uma situação que de normal não tem nada.
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