A Encruzilhada (2015), Lúcio Manfredi.
Era uma casa muito engraçada. Não tinha realidade, não tinha nada. Schroedinger foi passar uma tarde em Itapuã, e o livro que ele estava lendo era A Encruzilhada.
Max é um matador profissional que recusa um último serviço e decide se aposentar. Contudo, essa recusa o faz se transformar em alvo e, para tentar escapar com vida dessa caçada, é obrigado a entrar em uma casa onde estranhos fenômenos acontecem e nada é o que parece ser.
Normal é a última palavra que pode ser usada para descrever este livro. Lucio Manfredi consegue misturar a lógica dos sonhos com a física quântica, religiões afro-brasileiras e a ficção científica de Philip K. Dick, no que poderíamos batizar de saravápunk. A mistura poderia gerar um resultado estranho, mas Manfredi consegue dosar bem cada um desses elementos, que vão aparecendo naturalmente ao longo da trama. Os elementos da cultura brasileira são inseridos não para levantar bandeiras nacionalistas, mas se encaixando dentro do simbolismo fantástico construído pelo autor, resultando numa obra original e autoral.
O livro tem uma estrutura que talvez pareça difícil à primeira vista. Muitas coisas acontecendo ao mesmo tempo deixam o leitor tão perdido quanto o próprio protagonista, sem entender muito bem o que está acontecendo. Max é um assassino ou um estudante? É um escritor ou um soldado romano? E por que são sempre as mesmas pessoas que estão à sua volta? Seria a casa um sonho? Um estado de superposição quântica? Tudo e nada simultâneos, todos os Max e nenhum Max ao mesmo tempo? Como um grande quebra-cabeça, aos poucos as coisas vão se montando e conseguimos ter ideia da figura como um todo.
Grande parte da diversão do livro é o estilo irônico e informal do autor. Manfredi se utiliza de diversos jogos de palavras e ideias que tornam a leitura fluída e leve, apesar do tema pesado e da aparente confusão da trama. Nesse sentido, lembra um pouco os trabalhos mais autorais do roteirista Grant Morrison ou dos filmes de David Lynch, onde a confusão inicial abre espaço para questionamentos metafísicos profundos, levando o público a refletir sobre seus sentimentos mais caros.
A incerteza quântica do romance é a incerteza de nossas inseguranças, traumas e desejos reprimidos. A única certeza ao longo de toda a leitura é a sensação de perigo e de que algo está errado. Max precisa se encontrar, assim como todos nós. A grande jornada aqui é a do autoconhecimento. A Encruzilhada não é só um local, mas todos os caminhos possíveis que a vida entrelaça à nossa frente. E a escolha de onde devemos trilhar é sempre às cegas.
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