Duna de Jodorowsky (2013), Frank Pavich.
Deveria haver uma historiografia dos grandes filmes jamais feitos. Napoleão de Stanley Kubrick. O Coração das Trevas de Orson Welles. Dom Quixote de Terry Gilliam. A lista poderia ser imensa. Mas talvez nenhuma destas ausências tenha sido mais sentida, e ao mesmo tempo, mais influente, do que a adaptação do romance Duna, de Frank Herbert, pelo diretor Alejandro Jodorowsky.
Tomando para si a missão de contar a história da produção dessa obra não concluída, o diretor Frank Pavich rodou Estados Unidos, França, Suíça e Reino Unido entrevistando pessoas que trabalharam no filme, incluído aí o próprio Jodorowsky. Assim, temos um documentário com gosto de um bom sonho, daqueles que não dá vontade de acordar.
Sonho aqui é a palavra certa. Como diz Jodorowsky, Duna era o seu sonho. E para torná-lo realidade, não mediu esforços para convocar seus “guerreiros”. Pois não queria apenas uma equipe, mas gente comprometida a transformar em realidade cinematográfica o delírio visual e metafísico que havia imaginado.
Entre os guerreiros, havia gente como Moebius, H. R. Giger e Dan O’Bannon, que mais tarde se uniriam a Ridley Scott para fazer Alien. E no elenco, nomes como o próprio Orson Welles acima citado, além de Mick Jagger, David Carradine, Gloria Swanson e, como o imperador da Galáxia, Salvador Dalí. Na trilha sonora, Pink Floyd. A seleção assim virava um verdadeiro recrutamento, onde cada um era seduzido a ingressar na missão do capitão Jodorowsky. Aliás, uma das partes mais divertidas do documentário é justamente mostrar como se deu esse chamado às armas, principalmente o jogo de gato e rato que foi convencer Dalí a ingressar no time.
Infelizmente, os delírios de Jodorowsky foram grandes demais para caber em Hollywood. O alto custo do projeto, aliado a um roteiro extremamente longo, além da desconfiança no nome do diretor, fizeram com que a obra não encontrasse financiamento. É importante lembrar que até então Jodorowsky fizera apenas filmes no circuito alternativo, como A Montanha Sagrada e El Topo, que eram exibidos na sessão de meia-noite dos anos 70. Não possuía nenhum grande sucesso de bilheteria. A fama de excêntrico também não ajudou — ele mesmo afirma no documentário que sua intenção era dar ao público uma viagem de LSD sem que fosse necessário se utilizar da droga.
Mesmo sem ser finalizado, Duna teve grande influência no cinema norte-americano. O documentário, em um de seus momentos mais inspirados, compara os storyboards do projeto não realizado com cenas de diversos filmes, como Star Wars, Exterminador do Futuro, Flash Gordon, Prometeus, entre outros. Além disso, as ideias não utilizadas renderam grandes obras em quadrinhos, como Incal e Metabarões.
Grant Morrison, outro autor com grande influência mística, disse certa vez que seu grande objetivo com sua obra Os Invisíveis foi criar um grupo parecido com o das HQs na vida real, reunindo gente com os mesmos interesses. De maneira semelhante, isso aconteceu com Duna. Mesmo sem ser realizado, o sonho de Jodorowsky foi tão poderoso que gerou diversos frutos.
Fica então a curiosidade de como teria sido efetivamente assistir ao filme. Uma experiência única, sem dúvida, que talvez tenhamos acesso apenas na cinemateca do Sonhar, e apenas com uma preparação espiritual adequada se poderá ter acesso ao mesmo.
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