A arte perdida do pôster de filme

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O trailer de Pantera Negra já é um dos mais vistos dentre todos os trailers já lançados pela Marvel Studios. Antes do lançamento, veio o primeiro pôster do filme, e levantou uma discussão na internet: o que está acontecendo com os pôsteres da Marvel? O pôster trouxe o personagem interpretado por Chadwick Boseman sentado no trono como Rei de Wakanda, em uma imagem tão mal trabalhada digitalmente que dá a impressão de ser falsa.

O caso apenas reacendeu uma questão que vem sendo discutida há algum tempo. Recentemente, o mesmo aconteceu com o pôster de Homem-Aranha: De Volta ao Lar, que também é ruim. O projeto visual é confuso, superlotado de elementos e personagens, sem qualquer sinal do teor leve e divertido que os trailers revelam fazer parte do estilo do filme e do personagem. Não obstante, Tony Stark parece roubar a cena do verdadeiro dono do filme, um efeito ampliado justamente pelos excessos da imagem. Os pôsteres anteriores de Homem-Aranha: De Volta ao Lar, curiosamente, eram bem mais concisos e simplistas. E passavam essa ideia de um filme para um personagem jovem e descontraído.

Olhando para os cartazes de filmes de hoje em dia, é fácil esquecer que esta arte nem sempre foi dominado pelo design via Photoshop. Pôsteres como os da trilogia original de Star Wars, ou Indiana Jones, ou outros clássicos de antigamente, são itens em extinção e já foram a joia das estratégias de divulgação do meio cinematográfico. Aqueles pôsteres, produzidos por artistas renomados, como Drew Struzan, capturavam a essência do filme em belas pinturas, compostas em riqueza de detalhes e emoções. São frutos de uma época diferente, e que parece estar cada vez mais distante. Hoje vemos cartazes construídos com o básico: rostos fotografados dos atores que o estúdio quer que você veja, o título da marca e uma data de lançamento.

O nome de Drew Struzan, por exemplo, não é tão fácil de se escutar por aí, mas se você já viu um cartaz de cinema nos últimos 40 anos, você certamente conhece o trabalho dele. O artista de 67 anos é responsável por alguns dos mais emblemáticos pôsteres da história do cinema, ovacionado e respeitado por nomes como Steven Spielberg, George Lucas, Frank Darabont e Guillermo del Toro. Além dos filmes que citei antes, ele também fez Blade Runner, Aventureiros do Bairro Proibido, De Volta Para o Futuro, Enigma do Outro Mundo, entre muitos outros clássicos dos anos 1980 e 1990. Boa parte da história de Struzan é contada no documentário Drew: The Man Behind the Poster (2013), e se não conhece e gosta de cinema, recomendo fortemente que você procure e assista a este filme. Você entenderá um pouco do que é capturar o espírito e a emoção de um filme em uma imagem. No documentário, inclusive, Struzan compartilha sua visão sobre o que se tornou a arte de fazer pôsteres no mercado de cinema atual. Recentemente, ele foi responsável por um dos cartazes apresentados na divulgação de Star Wars: O Despertar da Força.

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Um cartaz malfeito, no que diz respeito à Marvel Studios, não vai impedir as pessoas de irem ao cinema assistir ao filme. Mas é um fato que a Marvel parece estar negligenciando esta área. Para uma gigante como a Marvel, que é sempre tão meticulosa com suas campanhas de marketing, isso não deveria acontecer. O problema da Marvel vem, provavelmente, da necessidade de alcançar o público mais amplo possível com suas produções. Claro que, hoje em dia, a Marvel não precisa pensar dessa forma, visto que transforma em ouro qualquer coisa que toca. Mas não foi sempre assim.

Desde o início, a Marvel usa este recurso de colocar no pôster tudo o que puder colocar sobre o filme, os personagens e a história. Basta ver como são os pôsteres desde o primeiro Homem de Ferro (2008). E pelo Homem de Ferro ter dado o pontapé inicial para o Universo Cinemático e ser sua estrela principal, Robert Downey Jr. sempre obteve posições de destaque nas artes dos filmes nos quais seu personagem aparece. Contudo, no início, os pôsteres ainda tentavam revelar algo sobre o enredo. Vide o pôster do próprio Homem de Ferro: há o traje tecnológico em destaque à esquerda, os atores principais enfileirados ao lado, Gwyneth Paltrow, e em menor escala, o Homem de Ferro ao fundo fugindo dos aviões e o traje de Obadiah Stane cercado por chamas. Além de revelar as estrelas por trás do filme, também dava pinceladas sobre momentos chave da trama. E ainda assim, apesar de ter muita coisa, era um pôster conciso.

Foi na época de Vingadores: Era de Ultron que a abordagem de jogar tudo no pôster começou a destoar. Ok, no caso de Vingadores, são muitos personagens e é relevante tê-los todos na arte de divulgação do filme. Mas ficou evidente que o Homem de Ferro era o elemento mais importante, e depois vinham os outros, disputando espaço de forma desproporcional na imagem, com um monte de elementos soltos no fundo. É basicamente um reflexo da cultura do exagero que vem ganhando cada vez mais força de uns anos para cá, no cinema e em várias outras mídias.

O curioso é que o pôster recém-lançado de Pantera Negra passa uma ideia de simplicidade. A arte é nítida, repleta de pequenos detalhes que exploram nuances do Pantera Negra enquanto personagem de uma nova proposta em termos de filme da Marvel. Mas o trabalho desleixado com o Photoshop afeta o equilíbrio das cores e a iluminação. Parece feito por um amador. Isso é consequência de um orçamento reduzido destinado à produção de cartazes. Investir em um artista respeitável, que faça um trabalho qualificado, exige tempo e dinheiro que os estúdios, em geral, não estão dispostos a gastar. É mais fácil pegar um monte de imagens das estrelas principais do filme e enfileirar em um fundo repleto de qualquer coisa que envolva chamas e explosões.

Imagina como será quando sair o próximo pôster de Pantera Negra: T’Challa de máscara e sem máscara, cercado por um monte de personagens, guerreiras africanas, veículos, tecnologias, explosões, flutuando em planos questionáveis e desproporcionais. Se seguir o caminho de Homem-Aranha: De Volta ao Lar, é o que pode acontecer, e olha que, no caso de Homem-Aranha, os primeiros pôsteres eram eficientes. No caso de Pantera Negra, apenas expôs ainda mais um problema recorrente nos pôsteres mais recentes da Marvel Studios. O que é uma pena considerando que o trailer de Pantera Negra é emocionante e bem-feito.

A verdade é que, infelizmente, a arte de fazer pôster de filme parece estar morrendo diante das necessidades comerciais crescentes do cinema moderno. A Marvel Studios, como parte da Disney, certamente tem orçamento o bastante para investir em um bom artista que possa fazer um bom pôster. Mas, para o estúdio, e para a maioria dos estúdios, o pôster não é considerado tão efetivo em termos de divulgação como um trailer na internet ou um comercial para a televisão. Um pôster faz um bom trabalho de divulgação, mas não se equipara ao poder midiático de um trailer, especialmente com os compartilhamentos nas redes sociais. Há ainda quem lute para manter esta arte perdida, como os artistas da Mondo, uma pequena empresa em Austin, Texas, que vem criando nos últimos anos alguns dos mais belos cartazes de filmes que você já viu.

O marketing através dos pôsteres vai continuar sendo uma ferramenta importante na divulgação de qualquer filme, mas é triste ver estúdios poderosos negligenciando uma forma de arte tão importante para o meio cinematográfico. Porque, sim, o cinema é um negócio, e como todo o negócio, envolve interesses comerciais. Mas o que muitos parecem esquecer, especialmente na era dos super blockbusters, é que o cinema também é arte, e precisa ser respeitado como tal, em todas as suas instâncias. Que fantástico seria se os pôsteres oficiais dos filmes de hoje em dia fossem como os antigos pôsteres de Drew Struzan, ou, no caso dos filmes de super-heróis, que surgissem como belas peças gráficas inspiradas na arte em quadrinhos de onde vieram.