Missão Impossível: Nação Secreta (2015), Christopher McQuarrie.
Tom Cruise está no auge de seus 53 anos, e a despeito do que eu, você e metade do universo possam querer acreditar, o cara continua a perseguir o IMPOSSÍVEL. A grande questão é que ele sabe fazê-lo com estilo invejável: sem dublês, sem excessos de computação gráfica, sem medo de brincar com exageros divertidos. Logo na sequência de abertura de Missão Impossível: Nação Secreta, ele diz a que veio e aonde quer chegar. Ele corre pela asa de um avião, e se agarra à porta enquanto espera que o sistema seja acionado remotamente para que ele possa entrar. O avião decola, com ele ainda agarrado à porta. ELE. Tom Cruise. Agarrado à porta. Sem um FUCKING dublê. Ele realmente alçou voo em um avião de verdade para gravar essa cena, como já fez em muitas outras cenas da franquia ao longo da carreira; tudo ali, claro, foi milimetricamente pensado para que Cruise pudesse fazer seu malabarismo, e o avião apenas subiu alguns metros do chão, deu uma volta e depois desceu, o bastante para filmar a cena com o máximo de realismo viável. Digno de respeito.
Isso, contudo, é apenas o começo. O prólogo. A pequena parte antes dos créditos iniciais do grande filme de espionagem que Cruise tem a nos oferecer. Missão Impossível: Nação Secreta é instigante e desafiador desde o princípio. O céu não é o limite, claramente. Por isso o impossível também envolve uma cena dramática em que Cruise mergulha em um vórtice de água assustador, lutando para concluir um plano com múltiplas variáveis e que, em certos momentos, acaba por depender unicamente da sorte. Ethan Hunt, como o início na loja de discos deixa transparecer, é um homem que se tornou quase uma lenda; e como muitos grandes heróis das lendas, ele conta muito com a sorte. O filme questiona essa sorte o tempo todo, ao mesmo tempo em que nos joga em situações que Hunt cada vez mais depende dela. Por outro lado, também acena para aspectos mais simples sobre trabalho, esforço e competência. A sorte às vezes é necessária para se fazer um bom trabalho, mas quando se é competente no que se faz, a sorte torna-se apenas um elemento de apoio inevitável.
Além da sorte, Hunt conta com uma equipe de apoio de eficiência cirúrgica. A começar pela Mission Girl da vez, a bela e maravilhosa e extremamente letal, Ilsa Faust, que surge como uma força da natureza toda vez que cruza o caminho de Hunt. Eles trocam flertes discretos, ensaiam um jogo de sedução que transita entre romance e amizade sem ultrapassar demais os limites de ambos os lados; e o jogo duplo entre os dois dá o tom para cada um deles. (Repare no nome Ilsa e no fato de ela aparecer numa casa em Casablanca.) Tom Cruise ainda tem o velho charme, do tipo irresistivelmente convincente, que atrai para ele não só a (suposta) confiança de uma mulher que acabou de conhecer, como também a plena confiança de seus companheiros da IMF. Mesmo Brandt (Jeremy Renner), sempre tão reticente em tomar medidas extremas, acredita nele apesar dos métodos heterodoxos (e quando está na corte, tentando defender Hunt e a IMF, rende alguns dos diálogos mais afiados do filme). Os momentos de maior alívio cômico ficam por conta de Benji (Simon Pegg), que sempre acaba envolvido nas loucuras de Hunt das formas mais complicadas e divertidas, embora seja tocante (de uma forma engraçada) a forma amistosa como Benji acredita que NADA é impossível para Hunt (o homem que virou uma lenda).
O diretor e co-roteirista Christopher McQuarrie constrói uma atmosfera que mistura o que há de melhor em toda a franquia, desde a ambientação enevoada e as pistas ocultas de um grande quebra-cabeça de Brian De Palma até a ação desenfreada (e com perseguição de moto) de John Woo, passando levemente pelo intimismo de JJ Abrams e pelas desconstruções na mitologia dignas de Brad Bird. McQuarrie consegue captar um pouco da essência de cada Missão Impossível anterior para trazer Missão Impossível de volta às origens sem perder tudo o que a série conquistou com o passar dos anos. Não só isso. Ele pega leves inspirações em James Bond e Tom Clancy para demonstrar quão frio e labiríntico é o mundo onde vive a IMF e outras agências de espionagem, e como grandes vilões podem nascer disso. Solomon Lane (Sean Harris, e qualquer semelhança com caçados de demônios Solomon Kane pode não ser mera coincidência) é um homem de olhar sutil e fala rouca, que controla o Sindicato como um fantasma por trás de seus óculos. Ele é um vilão sinistro, de dar arrepios.
Ainda assim, existe muito mais em jogo na história do que apenas desmascarar o Sindicato, especialmente para Ilsa. O que me traz de volta para Rebecca Ferguson, a melhor Mission Girl até agora — e só pode ser Mission Girl, porque Impossible Girl, só existe uma, e ela se chama Clara Oswald. — Ilsa é uma femme fatale em vários aspectos, e há mais para ela na trama do que podemos ver num primeiro momento. O que temos para ver, aliás, é incrível em todos os níveis. Ela é carismática, envolvente, luta com ferocidade e ainda possui uma compaixão que nunca sabemos se é legítima ou falsa. Ilsa é incrível por nunca nos deixar saber em que lado realmente está: se é aliada ou inimiga. Em qualquer que seja a circunstância, Ferguson é perfeita.
Ela também garante boas oportunidades para Cruise colocar suas habilidades em cheque. O espetáculo é tão grandioso que rapidamente abandonamos a lógica. Quem se importa se Hunt estava quase morto minutos atrás quando agora ele está em uma perseguição alucinante de motos? McQuarrie e seu diretor de fotografia conduzem a câmera e coreografam as cenas de luta muito bem, especialmente na sequência hitchcockiana da ópera. O ritmo da ação cresce de forma precisa, acompanhado de perto por uma trilha sonora inserida nos momentos certos. Pelo menos em quatro momentos somos tomados pela ansiedade do que está por vir, sedentos por um pouco mais da adrenalina que Cruise pode nos proporcionar. O desafio é lembrar de respirar depois de três minutos. Missão Impossível: Nação Secreta se mantém fiel ao espírito e ao ritmo espetacular da série, com tudo que poderíamos esperar: acrobacias mirabolantes, dispositivos incríveis de espionagem, enredo intrincado, e a jogada de mestre de Ethan Hunt para fortalecer um pouco mais sua lenda. Porque é exatamente como Alec Baldwin diz após ser inacreditavelmente surpreendido por uma missão impossível: “Hunt é a manifestação viva do destino.”
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