Dept. Q (2025), Scott Frank e Chandni Lakhani.
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Uma série muito boa de noir nórdico. Dept. Q, também conhecida como Departamento Q, gira em torno de um detetive mal-humorado e arrogante, mas extremamente competente, que assume um novo departamento da polícia de Edimburgo, na Escócia, especializado em investigar casos arquivados. Ele lidera uma equipe formada por outros “desajustados” da corporação.
A série é uma adaptação de Scott Frank e Chandni Lakhani. Frank é o mesmo criador de O Gambito da Rainha e conhecido por escrever diversos filmes como Minority Report e Logan, enquanto Lakhani trabalhou em séries como Black Mirror e Dublin Murders. Dept. Q é baseada nos romances policiais do autor dinamarquês Jussi Adler-Olsen. Essa primeira temporada se inspira no primeiro livro da saga e apresenta o detetive Carl Morck, interpretado de forma sarcástica e cativante por Matthew Goode, um ator que eu gosto bastante por alguns trabalhos como o Ozymandias de Watchmen, Segredos de Sangue, entre outros.
Uma das grandes coisas aqui é que Morck é um homem ferido física, psicológica e emocionalmente, que está lidando com um transtorno de estresse pós-traumático após sobreviver a um tiroteio que deixou seu melhor amigo paralisado. Esse trauma pessoal já nos pega de surpresa logo no início da série e serve de pano de fundo para a construção de toda a narrativa. Paralelamente, o Departamento Q assume seu primeiro caso sobre o desaparecimento da promotora Merritt Lingard, dada como morta, mas cujo processo apresenta inconsistências que despertam a curiosidade da equipe.
E uma grande parte do charme da série se deve justamente a equipe do Departamento Q. Um deles é Akram, um ex-policial sírio educado e comedido nos modos, que esconde um passado violento. Outra integrante é Rose, uma detetive que sofreu um colapso nervoso, acabou sendo colocada numa posição mais burocrática e quer voltar para o trabalho de investigação em campo. Ela acaba trabalhando mais próxima do James Hardy, o parceiro de Morck, que perdeu os movimentos no tiroteio e auxilia nas investigações durante sua reabilitação. James, aliás, é um dos grandes destaques.
A série ainda conta com alguns bons personagens, como a psicoterapeuta Rachel Irving, que tem uma relação divertida de altos e baixos com Morck, o enteado adolescente mal-humorado do detetive, e um inquilino descontraído que traz um ar mais leve. É divertido porque toda a história pessoal do Morck não é muito convencional, com toda uma dinâmica de personagem que acrescenta bastante.
O excelente elenco conta com várias personalidades do cinema britânico e escocês. Além de Matthew Goode, temos Alexej Manvelov como Akram, Leah Byrne como Rose, Jamie Sives como James Hardy, Kate Dickie como Moira, chefe de Morck, Kelly Macdonald como a Dra. Rachel Irving e Chloe Pirrie como Merritt Lingard, a jovem e ambiciosa advogada que está desaparecida há quatro anos, foi dada como morta e inspira a investigação que movimenta essa primeira temporada da série.
Cabe ressaltar que os livros também já renderam uma série de filmes dinamarqueses de sucesso, e essa adaptação da Netflix tem tudo para seguir o mesmo caminho. Gostei bastante da forma como a narrativa é construída, com múltiplos mistérios que se desenvolvem em paralelo e são bem equilibrados com o desenvolvimento dos personagens. O ritmo é lento e bem executado, às vezes dando espaço para flashbacks que enriquecem a história.
A vibe da série me lembrou um pouco outras séries de noir nórdico, como The Bridge e Forbrydelsen, que inspirou a versão americana The Killing. Só que, ao contrário das outras, Departamento Q consegue ser mais leve que o noir nórdico convencional, ainda que também seja um série densa como qualquer outra do gênero. A série trabalha muito bem seus temas sobre violência doméstica, isolamento, degradação urbana, perigos urbanos, além de questões emocionais e psicológicas como amor, vingança, trauma e crueldade.
Dept. Q, o Departamento Q da Netflix, é uma série muito boa e instigante que sabe ser divertida e angustiante, com um bom espírito de noir nórdico, o charme de um bom procedimento policial e um humor mórbido muito afiado. Eu gostei bastante.
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