Culpada por Romance (2011), Sion Sono.
Uma história arrasadora sobre amor, crime, sexo e morte. Dirigido por Sion Sono, o longa é originalmente a parte final da chamada “Saga do Ódio”, formado ainda por outras duas produções: Amor em Exposição (2008) e Peixe Frio (2010).
Tudo começa quando o cadáver esquartejado de uma jovem é encontrado numa rua de motéis (e prostituição) em Shibuya. A trama gira em torno de três mulheres: a detetive que cuida do caso, uma dona de casa e uma professora de literatura. Kazuko Yoshida (Miki Mizuno) é chamada para o caso quando está num encontro com o que parece ser um amante, sendo que ela é mostrada como uma mulher casada mãe de uma menina. No local do crime, um quarto sujo e decadente, a detetive encontra o corpo da vítima cortado em partes que foram ligadas a pedaços de um manequim. Kazuko toma como objetivo descobrir o que aconteceu com aquele cadáver e, aos poucos, vai descobrindo uma história tão sórdida e chocante quanto o estado de mutilação da vítima. Então conhecemos Izumi Kikuchi (Megumi Kagurazaka), esposa dedicada de um famoso escritor, mas que serve mais como uma empregada e um mero acessório para o companheiro. Presa sozinha e ociosa em casa durante horas, Izumi decide procurar um emprego e acaba se envolvendo com o mundo da pornografia. Não demora muito até a tímida e recatada Izumi se tornar uma prostituta de personalidade forte e sedenta por sexo. Por fim surge Mitsuko Ozawa (Makoto Togashi), uma professora de literatura que trabalha como prostituta à noite e acredita exercer poder sobre os homens ao exigir dinheiro em troca de sexo. Os caminhos de Izumi e Mitsuko acabam se cruzando e elas se veem presas numa rede de tragédia e decadência.
O filme é um misto de romance e thriller de assassinato. À medida que a decadência humana vai tomando conta da tela, o lado bonito vai sendo consumido por uma atmosfera angustiante e traiçoeira, com toques de gore nas cenas mais violentas. É uma obra de grande qualidade visual e narrativa.
A repetição dos rituais familiares de Izumi dá a sensação exata de quão robotizada é a personagem, presa numa rotina deprimente e que não parece ter um fim. Izumi, aliás, retrata uma realidade muito comum dos japoneses: a repressão excessiva das emoções. O Japão evoluiu fundamentado por códigos rígidos de conduta e mesmo hoje, em pleno século XXI, muitos ainda não conseguem abandonar estes códigos. E quando conseguem abandonar, muitas vezes quando ninguém está olhando, não são raros os casos de indivíduos que perdem completamente a noção e o bom senso na hora de extravasar suas perversões. A história toca nestes temas. E nas consequências que surgem quando os limites são ultrapassados.
Dividido em cinco capítulos, o filme traz muitas reflexões sobre o Japão contemporâneo. Há muitas conversas sobre diversos assuntos e questões éticas e morais. O livro O Castelo, de Franz Kafka, é frequentemente citado na narrativa como forma de explorar os dramas existenciais.
E o elenco é fenomenal. Com destaque para Megumi Kagurazaka e Makoto Togashi. Kagurazaka tem charme nas mudanças entre recato e perversão de sua personagem (e a atriz passa boa parte do filme nua). Togashi é a alma da história. Sua interpretação é fantástica e perturbadora, com sua insanidade transmitida através de expressões faciais e movimentos de cabelo. Em alguns momentos, é como se ela estivesse possuída.
Culpada por Romance é fortemente em um caso real do Japão que aconteceu em 1997, o assassinato de Yasuko Watanabe, uma pesquisadora que trabalhava como prostituta à noite em Shibuya, onde seu corpo foi encontrado.
O roteiro aborda a investigação do homicídio em paralelo com a vida dos personagens principais, entrelaçando as tramas para se aprofundar em um estudo intenso sobre a degradação humana. Porque o filme é basicamente sobre isso: degradação e suas consequências. Às vezes, exagera um pouco. Mas no geral, o impacto é grande.
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