Nosferatu (2013), Joe Hill.
O livro conta a história de Victoria “Vic” McQueen, que desde menina possui o dom de achar coisas perdidas após atravessar uma ponte que só ela tem acesso, e seu confronto com Charles Manx, um homem com mais de 100 anos de idade que sequestra crianças e as leva para A Terra do Natal, onde se vive um eterno 25 de dezembro. Depois de um encontro trágico entre ambos na adolescência, Manx retorna para sequestrar Wayne, o filho de Vic.
Joe Hill é cruel. Joe Hill é sádico. Joe Hill não tem pena de seus leitores, e muito menos de seus personagens. Joe Hill sabe que uma história de terror não é para dar sustinhos, mas para transformar o homem mais corajoso em uma criança chamando pela mamãe.
Em seu terceiro romance, o autor mostra uma incrível habilidade de construir um clima tenso e alucinante. O leitor simplesmente tem que continuar a leitura para saber o que vai acontecer. Ao mesmo tempo, tem medo de virar a página, pois sabe que ninguém está a salvo. E o medo não é só de seu personagem favorito morrer, mas de que ele se dê mal da forma mais trágica possível.
Não espere alívio cômico em Nosferatu. Aqui, as poucas piadas são de um humor tão negro que a única risada possível é a de nervoso. O livro não é um parque de diversões, quem embarca na viagem sabe que vai sofrer um bocado, e vai chegar ao final como alguém mais forte e cascudo.
Conhecemos a protagonista Victoria McQueen quando ela ainda é criança. Ela possui um dom especial: atravessar uma ponte mágica que lhe permite ir a qualquer lugar do mundo e/ou encontrar alguma coisa perdida. Mas há um preço: quanto mais ela usa sua habilidade, mais sua saúde física e mental é afetada. Com o tempo, a própria sanidade de Vic é comprometida, dando aspectos trágicos à sua vida.
Quando adolescente, ela briga com os pais e resolve procurar encrenca. E o nome da encrenca é Charles Manx. Ele também possui uma habilidade: com seu Rolls-Royce Wraith 1938, transporta crianças para a Terra do Natal, um lugar onde todo dia é 25 de dezembro. Lá, ficam sempre com a mesma idade e vivem felizes para sempre. Em troca, sem saber, dão suas almas para o vilão, que assim consegue viver eternamente jovem.
O encontro dos dois traz consequências nefastas para ambos. Anos depois, com Vic já adulta, Manx resolve se vingar e sequestra Wayne, o filho dela.
O curioso é que vilão talvez não seja o termo certo para descrever Manx. Ele se vê como um herói, alguém que livra as crianças do mundo hipócrita dos adultos. Ele é incapaz de fazer mal a qualquer criança. Mas com os adultos, aí já é outra história.
Mais assustador ainda é o seu capanga, ou sidekick – dependendo do ponto do vista. Bing Partridge é um adulto com a mente de uma criança cruel, do tipo que não vê problemas em abrir um bicho vivo. Carrega consigo em gás alucinógeno que usa para atordoar suas vítimas antes de estuprá-las, torturá-las e matá-las. Tudo isso de maneira calma, quase como uma brincadeira. Só tem uma pessoa a quem ele odeia de verdade: Victoria.
O destaque vai ainda para Louis “Lou” Carmody, o pai nerd de Wayne, o único cara realmente simpático nessa história, e que garante as citações à cultura pop que todos gostamos. E por fim, os agentes do FBI, liderados por Tabitha Hutter, os quais você tem certeza de que farão alguma besteira até o final da trama.
Além do clima tenso, Hill ainda é muito bom no desenvolvimento de personagens. Todos eles possuem motivações claras, são falíveis e identificáveis com o leitor sob algum ponto de vista. Por isso mesmo a leitura é tão insana, pois é fácil você sentir dor por ver alguém se dando mal.
Por outro lado, todo esse clima angustiante acaba causando alguns problemas de ritmo. A agonia é tanta em certos momentos que eles acabam sendo lentos demais, prejudicando um pouco a fluência da leitura. Isso se dá ainda porque, assim que você entende o estilo do escritor, a trama em vários momentos se torna previsível, o que desanima um pouco. Mas a qualidade da narrativa, do clima e da construção de personagens fazem o leitor querer seguir em frente. Talvez se tivesse umas 100 páginas a menos, o romance seria bem melhor acabado. Mas ainda assim, do jeito que está, é uma leitura simplesmente foda!
O mais assustador é pensar que A Terra do Natal é um reflexo distorcido da nossa própria realidade. Vivemos em tempos em que a festa não pode parar. Somos cobrados a sermos felizes 24 horas por dia. Nas redes sociais, todos são só alegria. A tristeza e a felicidade são proibidas. Isso se reflete na dificuldade de amadurecimento dos adultos, fazendo de todos eternas crianças num eterno dia de Natal. E assim vão nascendo os pequenos monstros, insensíveis a qualquer dor, reagindo a tudo com escárnio e falta de responsabilidades.
Portanto, esteja avisado. Se quiser embarcar na garupa da moto Triumph de Victoria, esteja preparado! A viagem não é fácil, mas é garantido que ao final, percorrer esta estrada, terá sido extremamente gratificante.
PS: Para quem já leu os outros romances de Joe Hill, este livro tem um easter egg simplesmente sensacional.
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