Zetsuen no Tempest

Zetsuen no Tempest

Zetsuen no Tempest

Zetsuen no Tempest (2009), Kyo Shirodaira e Arihide Sano -anime (2012).

Um anime peculiar e muito bom. Mesmo quando explora aspectos óbvios de gênero, há momentos de exploração de cotidiano, comédia de harém e até mesmo ação de super-heróis. Mas em vez cair nos problemas típicos, desafia os rótulos com uma rebeldia que deve ser respeitada. Isso é uma coisa boa. Às vezes é satisfatório acompanhar um anime que não se perde nas explorações intermináveis de suas próprias ambições a ponto de se tornar uma paródia de seu próprio enredo, cenário e clichês. Zetsuen no Tempest não está completamente livre disso, mas mesmo em seus momentos de falha, ele se sai bem na construção de sua referência shakespeariana.

Hakaze Kusaribe é a princesa e líder de uma família de magos dedicada à proteção da Árvore do Gênesis desde tempos ancestrais. Até o dia que Samon Kusaribe tenta ressuscitar a Árvore do Êxodo, que se opõe à Árvore do Gênesis e controla o poder da destruição. Para realizar seus planos, Samon prende Hakaze em um barril e a abandona em uma ilha deserta, de onde ela envia uma mensagem que é encontrada por Mahiro Fuwa. Ele deseja se vingar da pessoa que matou sua irmã, Aika, e concorda em ajudar Hakaze sob a promessa de que ela usará sua magia para encontrar o assassino da irmã. Mas as coisas tomam rumos inesperados quando Yoshino Takigawa, melhor amigo de Mahiro e secretamente namorado de Aika, é resgatado de uma situação de perigo e acaba envolvido nesta história de traição e vingança.

Uma das melhores coisas do anime é que ele usa alegremente e abertamente temas e tópicos de algumas das maiores peças de Shakespeare e até discute esses elementos com citações diretas às peças dentro do contexto da trama. Os temas de vingança e perdão são comparados à Hamlet e A Tempestade, levando a uma comparação entre os finais destas peças e a ideia, respectivamente, de abraçar a tragédia ou evitar a tragédia. É comum que tema tão ambiciosos e interessantes se percam em roteiros perdidos e mal desenvolvidos. Mas não é o caso aqui, e como amante de Shakespeare, isso me deixa imensamente feliz.

Zetsuen no Tempest tem problemas, claro. Alguns, inclusive, envolvendo escolhas do roteiro depois que a situação com Hakaze é resolvida. Dentre os problemas estão a forma como os eventos são espalhados pela série, de forma tão desequilibrada e insatisfatória que afeta o bom andamento da história em alguns momentos. Momentos dramáticos como o confronto entre Samon e Yoshino são desnecessariamente esticados ao ponto de uma conversa intensa entre inimigos se tornar um pouco constrangedora por se estender demais em elucubrações desnecessárias. A impressão que dá é que esticaram ao máximo os fatos para: render um pouco mais o anime e/ou evitar que o desfecho do fato viesse rápido demais, que é quase como colocar um filler no enredo – e isso raramente é bom. – Isso acontece em alguns outros momentos, o que muitas vezes torna alguns dos personagens secundários irrelevantes para o todo.

Mas apesar dos problemas, ainda há muito no anime a se recomendar. E seus méritos, sem dúvida, superam suas falhas. Principalmente no que diz respeito aos personagens. Mahiro, Hakaze e Yoshino são bem desenvolvidos, construídos com profundidade e sem deixar pontas soltas em suas intenções e relacionamentos. Eles possuem personalidades cativantes e repletas de camadas. A cada episódio, queremos desbravar e conhecer mais e mais sobre eles. Hakaze possui inteligência e confiança dentro de sua missão como maga, mas é ingênua e tímida com seus sentimentos e coisas que estejam fora de seu controle. Mahiro é esquentado e impulsivo, mas mostra inteligência e prudência enquanto busca vingança pela morte da irmã. Yoshino cria um contraponto para Mahiro com seu jeito introspectivo e contemplativo, ao mesmo tempo que isso faz dele uma incógnita constante dentro dos acontecimentos da trama. A conexão entre os três – e Aika, irmã de Mahiro – é natural e nos desperta simpatia. Eles basicamente sustentam o anime.

A música acrescenta peso adicional aos momentos que vão crescendo e ganhando mais contornos ao longo da história. As aberturas auxiliam neste impacto, especialmente a primeira, “Spirit Inspiration” da Nothing’s Carved in Stone, que é facilmente uma das minhas músicas preferidas atualmente (a banda também). O visual também é fantástico. Os elementos de ação e fantasia são grandiosos, bem articulados e maravilhosamente realizados pelo sempre competente estúdio Bones. O sistema de magia, que retira energias da Árvore do Gênesis através do consumo de itens cotidianos, é criativo e coerente, de dar orgulho em grandes escritores de fantasia como Ursula K. Le Guin e Brandon Sanderson.

O confronto supracitado entre Samon e Yoshino é um dos momentos altos do anime e um ponto chave na história ao revelar uma reviravolta impressionante no drama de Hakaze. A própria revelação da verdade por trás da morte de Aika é impressionante e faz valer cada mistério criado ao redor da personagem. Zetsuen no Tempest funciona justamente por seu enredo bem desenvolvido, de temática forte e de reviravoltas que não são tão fáceis de prever. O elemento shakespeariano nos atrai com ainda mais vigor para esta saga de amor, vingança e perdão.