Gavan

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Uchuu Keiji Gavan (1982), Saburo Yatsude (Toei Company).

A primeira série tokusatsu da franquia Metal Hero, produzida pela Toei Company (usando o pseudônimo coletivo “Saburo Yatsude”) e exibida originalmente em 1982. A história seguia as aventuras do Policial do Espaço Gavan. Começa quando a Terra é invadida pela Organização Criminosa Makuu, liderada por Don Horror, que destrói uma colônia espacial perto do planeta. Don Horror tem um objetivo simples: dominar todo o universo, e a Terra representa um passo para essa conquista, porém é onde seus planos enfrentam seu maior obstáculo. Em resposta ao ataque de Makuu, a Polícia da União Galáctica, sediada no planeta Bird, designa Gavan (Kenji Ohba) como protetor da Terra, uma vez que ele próprio é um mestiço, filho de um habitante do planeta Bird e uma terráquea. Gavan é ajudado por Mimi (Wakiko Kano), filha do Comandante Qom (Toshiaki Nishizawa), o homem que coordena as ações da Polícia, auxiliado por Marin (Kyoko Nashiro). Ao chegar à Terra, Gavan assume a identidade de Takeshi Ichijouji (Retsu Ichijouji no original) e começa a trabalhar disfarçado em um clube de equitação, a fim de investigar as ações da Makuu no planeta e combatê-los.

Muitos dos que cresceram assistindo aos tokusatsus na década de 80 e 90 certamente se lembram de ter acompanhado a série Uchuu Keiji Gavan durante a infância. No Brasil, foi exibida na Rede Globo com o título de Space Cop, e na TV Gazeta. A série é a primeira da trilogia dos Policiais do Espaço (Uchuu Keiji), seguida por outras duas séries: Sharivan e Shaider. Os três Policiais do Espaço são os antecessores de Jaspion, embora tenham vindo para terras brasileiras depois. Na época em que Gavan – ou Gaban, se você preferir – começou a ser exibido na Globo, muita gente acreditava que a série era na verdade uma cópia de Jaspion, e não se tinha grande acesso a informações sobre essas séries como se tem hoje em dia graças à internet, embora existisse uma certa noção de que eram séries similares.

A verdade é que Gavan é o primeiro Metal Hero. E na época de seu lançamento – 1982 –, obteve grande sucesso. A série é considerada até hoje uma das melhores já produzidas em sua década, e salvou a Toei da grave crise financeira que enfrentava na época. Com planejamento e investimento consideráveis, a Toei tentou aproveitar o entusiasmo da época pela ficção científica, que crescia graças a filmes como Star Wars. O próprio projeto visual do personagem inspirou um filme icônico, RoboCop, do diretor Paul Verhoeven.

Os efeitos especiais eram impressionantes para a época, e o trabalho com atores e dublês na gravação das cenas de luta contribuiu para alcançar um público maior para a série, especialmente entre os jovens. Ainda havia o trabalho da Bandai com a produção massiva de brinquedos – não é muito diferente do que acontece hoje com filmes da Marvel, por exemplo. – O investimento na série e seu sucesso ajudaram no crescimento do mercado de tokusatsus, e para que essas séries chegassem a outros países, como o Brasil.

Aqui no nosso país, contudo, Gavan passou um pouco despercebido, em um movimento curiosamente contrário ao que aconteceu em seu país de origem. No Japão, o sucesso de Gavan gerou dois spin-offs diretos, Sharivan e Shaider, e depois, em 1985, deu origem a Jaspion, que não tinha ligação com as anteriores – Jaspion deveria ter sido o quarto Policial do Espaço, mas a Toei mudou de ideia quando estava produzindo a série. – O curioso é que Jaspion fez um sucesso absurdo no Brasil, enquanto no Japão amargou um fracasso considerável, talvez porque o público estivesse cansado das repetições comuns a esse tipo de série – Sharivan e Shaider eram quase iguais entre si, de tantas ideias aproveitadas uma da outra. – No caso de Gavan, o público brasileiro estava mais do que disposto a assistir qualquer nova série que se parecesse com Jaspion, mas o problema talvez tenha sido o fato de Gavan ter tido pouca publicidade em cima, e por ter sido exibida na Globo, um canal que nunca teve histórico com tokusatsus – até hoje não tem –, logo não possuía a mesma moral e nem o mesmo público que a Manchete – ou a Bandeirantes – para esse tipo de programa. Digo isso porque conheço MUITA gente que adora Jaspion, mas nunca viu Gavan.

Outro problema é que muitos episódios foram exibidos fora de ordem, de forma aleatória, o que fazia com que muitos desistissem de acompanhar no meio do caminho. A série também teve uma das piores dublagens da história dos tokusatsus da televisão brasileira, com frases que não faziam sentido, nomes de golpes e personagens que mudavam constantemente – sofrimento maior para o Caçador Maligno, ou Caçador Implacável, ou Matador Implacável, ou whatever –, e narração exageradamente cômica quando devia soar um pouco mais séria. A única coisa interessante é que o dublador brasileiro de Gavan tinha a voz abafada quando o herói estava transformado, para simular a voz por trás de uma máscara.

Uchuu Keiji Gavan não é uma série genial ou sensacional, apesar de seu sucesso. Na verdade, ela é fruto de uma época, e funciona maravilhosamente bem quando colocada no contexto dos anos 1980 e 1990. Como primeiro Metal Hero, muita coisa tratava-se de experimentação por parte da Toei – coisas que estavam sendo testadas para ver se valiam a pena, e coisas que passaram a ser usadas nas séries que vieram depois. – O ator Kenji Ohba é um dos grandes responsáveis pelo sucesso da série. Além carismático e excelente dublê, ele fazia várias de suas cenas de ação. Wakiko Kano é uma graça, e sua interação com Ohba tinha uma química adorável. O carinho e a cumplicidade entre Gavan e Mimi é um dos pontos altos da história. Uma curiosidade é que Kano saiu da série no episódio 30 sem razão aparente e voltou apenas no episódio 42 – para efeitos de enredo, Mimi tinha voltado ao planeta Bird para cuidar da mãe doente. – Kyoko Nashiro, que interpreta Marin, assumiu o posto de parceira de Gavan durante a ausência de Mimi, mas não aparecia tanto, servindo mais como uma coadjuvante de luxo.

No penúltimo episódio, Gavan consegue finalmente encontrar seu pai – um de seus objetivos principais na história – ao resgatá-lo de uma base da Makuu. O Policial de Espaço Voicer, pai de Gavan, é interpretado por ninguém menos que Sonny Chiba, um dos atores mais icônicos dos filmes de artes marciais japoneses, e que apareceu como Hattori Hanzo no filme Kill Bill Volume 1 – outra curiosidade é que Kenji Ohba também aparece em Kill Bill Volume 1 como o assistente de Hattori Hanzo em sua loja de sushi.

Alguns elementos interessantes da série, e que certamente contribuíram para seu sucesso, são sua identidade visual e sua trilha sonora. Uchuu Keiji Gavan possui uma identidade de ficção científica que se aproxima um pouco de RoboCop, com um clima meio sombrio e aterrorizante, misturado com imagens psicodélicas e movimentos de câmera vertiginosos, especialmente quando o sistema de retrocesso mudava o cenário para o Espaço Makuu, uma dimensão bizarra onde Gavan enfrentava os monstros da organização criminosa. O Espaço Makuu era acessado através de um sistema que fazia a Terra girar ao contrário – uma ideia divertida, mas que não tem nada a ver com nada –, criando uma espécie de mundo alternativo demoníaco e cheio de luas e planetas. Para a época, era um efeito visual macabro e que causava impacto, especialmente para crianças. O propósito do sistema de retrocesso provavelmente era apenas esse mesmo, causar impacto com um efeito especial bizarro. Era uma coisa mais gráfica mesmo. Porque para efeitos de enredo, nunca fazia qualquer diferença.

Outro elemento de impacto é a trilha sonora, a começar pela empolgante abertura cantada por Akira Kushida – o cara das músicas de abertura das séries de Metal Hero –, que cumpria muito bem o papel de apresentar Gavan como um poderoso policial de armadura metálica que enfrenta criminosos malignos. As músicas incidentais, por sua vez, sempre transmitiam urgência. A série, como acontece normalmente em tokusatsus, é bastante baseada em repetições e no esquema de monstro do dia, e apesar de toda a simplicidade de suas ideias e das batalhas sempre parecidas, a música SEMPRE estava lá para expressar a urgência do combate ao crime. Ainda que soubéssemos que Gavan venceria no final, a música garantia uma sensação de que o herói estava lutando contra um monstro que talvez não pudesse derrotar. Esse aspecto sonoro é algo que se tornou comum aos tokusatsus dessa época, mas que se perdeu um pouco hoje em dia.

Uchuu Keiji Gavan terminou com um final rápido – um pouco abrupto – depois de 44 episódios, fechando bem alguns pontos da história. Nos últimos episódios, Gavan consegue salvar o pai e finalmente fica frente a frente em batalha contra Don Horror, derrotando-o e destruindo de uma vez por todas a Organização Makuu. Antes do fim, ele é ajudado por Den Iga (Hiroshi Watari), que surge como o Policial do Espaço Sharivan, designado para ser o novo guardião do setor do planeta Terra. Gavan é promovido a capitão, tornando-se uma participação especial na série dos Policiais do Espaço que vieram depois, e um dos mais importantes heróis da cultura pop japonesa.

Em 2012, como parte das comemorações do aniversário de 30 anos da estreia da série e do aniversário de 35 anos dos Super Sentai, Gavan participou do filme Kaizoku Sentai Gokaiger VS Uchuu Keiji Gavan, em que pela primeira vez dois seriados de universos diferentes se encontraram na tela do cinema. Ainda em 2012, também estreou Gavan: The Movie, que apresentou Geki Jumonji (Yuma Ishigaki) como o novo Gavan Type-G, discípulo do Policial do Espaço de Kenji Ohba, agora bem mais velho. Gavan Type-G abriu uma nova fase para o gênero Metal Hero, trazendo de volta os heróis clássicos das décadas de 80 e 90 para uma nova geração.